Prof. Júlio César Medeiros

PROFESSOR DE HISTÓRIA

juliocesarpereira@id.uff.br

SOBRE

Júlio César Medeiros é Dr. em História da Ciência e da Saúde pela Fiocruz.  É professor de História Contemporânea com enfase em África, da Universidade Federal Fluminense, pesquisador do Instituto de Pesquisa e Memória Pretos Novos e Líder do Núcleo de Estudos e Pesquisa SANKOFA-UFF.

 

A Revolução Americana e as suas contradições

Postado por MEDEIROS DA SILVA PEREIRA em 12 mar 2021

     A Independência dos Estados Unidos é considerada a primeira revolução americana. A segunda foi a Guerra de Secessão.

    

     As treze colônias inglesas da América formaram-se lentamente a partir do século XVII. Nos fins do século XVIII ocupavam uma faixa litorânea que ia do Atlântico até os contrafortes dos Aleghanis.

          As colônias do Norte, Massachusetts, Nova Hampshire, Rhode Island e Connecticut, região denominada Nova Inglaterra, reuniam uma população de 680 mil habitantes. No Centro, cerca de 350 mil habitantes moravam nas quatro colônias: Pensilvânia, Nova York, Nova Jersey e Deware. No Sul mais 980 mil povoavam as cinco colônias : Virgínia, Maryland, Carolina do Norte, Carolina do Sul e Geórgia. Ao todo, uma população de mais de 2 milhões de colonizadores.

          O desenvolvimento dessas colônias foi desigual, no Centro – Norte predominava a pequena e média propriedade, policultura, manufatura, exploração a madeira e da pesca. Logo as atividades comerciais dos colonos do Norte ultrapassaram as fronteiras coloniais; e fez surgir atritos insolúveis. 

          No Sul prevalecia a grande propriedade, escravista e monocultora,, voltada à exportação, típico do sistema de pacto colonial.

          A reação da Metrópole crescimento do comércio colonial foi, no começo, a adoção de uma nova política, que se resumia em aplicar leis já existentes.

          A política de repressão adotada pela Inglaterra e a influência do Iluminismo foram fatores importantes que determinaram a Independência dos Estados Unidos.

Fatos essenciais

Século XVIII : Início da colonização da América do Norte.

1756 – 1763 : Guerra dos Sete Anos.

1764: Lei do Açúcar, Ato de Quebec, Lei da Moeda.

1765 : Lei do Selo.

1765 : Lei de Aquartelamento.

1767 : Atos Townshend.

1773 : Lei do Chá.

1774 : Atos Intoleráveis.

1774 : Primeiro Congresso Continental de Filadélfia.

1775 : Segundo Congresso Continental da Filadélfia. Em 10 de abril de 1775, ocorreu o primeiro combate em Lexington entre tropas reais e milícias de colonos. Outros combates ocorreram em Concord e Bunker Hill.

1775 : Início dos choques armados.

No ano seguinte, em 04 de julho de 1776, houve o Segundo Congresso Continental, em que foi redigida a Declaração de Independência e houve a criação do exército colonial, que enfrentou com mais propriedade o exército inglês. Nos anos que se seguiram, as batalhas vencidas pelos colonos americanos, sobretudo após a ajuda de espanhóis e franceses, acabaram por solidificar a autonomia dos EUA Declaração da Independência e dos Direitos do Homem.

1775, o Primeiro Congresso Continental, onde foi elaborada a declaração de direitos sob inspiração iluminista.

1781 : Vitória decisiva e Yorktown.

1783 : Tratado de Versalhes.

O clima de insatisfação e revolta contaminou muitos dos colonos, inclusive alguns que antes não estavam a favor do choque com a coroa inglesa.

Entre os líderes, estavam os nomes de Thomas Jefferson, Samuel Adams, Richard Lee e Benjamin Franklin.

No entanto, apesar de se falar e lutar pela liberdade, manteve-se a a escravidão.

Nazismo e fascismo, os pesadelos que não passam

Postado por MEDEIROS DA SILVA PEREIRA em 05 nov 2020
Sem Comentários

Por: Prof. Dr. Júlio César Medeiros da Silva Pereira[1]

O mundo tem sido, nos últimos anos, aterrorizado pelo fantasma do nazismo e do fascismo. O movimento antifas, termo abreviado de antifascismo, que dá nome a um movimento político dedicado ao combate o fascismo é um sintoma de que permanece vivo, ainda que, de certa forma escondido, um movimento fascista, do contrário, não teríamos visto milhares de adesões ao movimento em vários grupos de redes sociais. Onde há fumaça a fogo.

O objetivo deste texto é o de tentar traças algumas mudanças e permanências entre o que teriam sido estes regimes totalitários e como e suas permanências, posto que, embora não percebido por uma grande parcela da população, se não existe de fato, ou seja, reconhecidamente legal, seus conceitos permanecem vivos, infelizmente, na sociedade[2]. De um lado, pessoas defendem que tais regimes não podem ser vistos anacronicamente, descontextualizados de sua época e tempo, de outro, muitos acreditam que as sim. Eles estão bem vivos e assombrando a atualidade. Para sair deste impasse, recorramos a História e vejamos analisemos o que eles foram e representaram,  seus ideários e propostas a fim de identificarmos seus vestígios a fim de comprovarmos, se que é possível a sua existência hoje.  Para tantos, iremos fazer uma reconstrução histórica do que foram estes movimentos em seu contexto e os indícios da sua permanência no tecido social de uma forma global, a fim de compreendermos os seus malefícios e a importância do conhecimento do passado para podermos superar e neutralizar suas ações.  

O mundo Pós 1ª Guerra Mundial

O fim da 1ª Guerra trouxe diversas mudanças para o mundo, principalmente para a Europa. Os altos custos da guerra levaram todas as potências europeias a uma grave crise econômica. Este fato  culminou com a ascensão dos EUA como a maior potência industrial, financeira e bélica do mundo.

Além disto, as mulheres ganharam as ruas. Como grande parte da população masculina europeia participou da guerra, as mulheres conquistaram um espaço no mercado de trabalho. Após a guerra, elas continuaram exercendo suas funções em lojas, fábricas e etc., porém com salários inferiores ao dos homens, desigualdade que se perpetua até os dias de hoje, em muitos setores.

A situação política na Europa também se complicou, visto que surgiram novas correntes políticas diferentes das democracias liberais que governavam a Europa antes da guerra. Nas décadas de 1920 e 1930, o mundo assistiria perplexo o surgimento de movimentos extremistas e autoritários como os  Fascismo e Nazismo.  

Também é importante lembrar que o fim da guerra marcou também o fim dos grandes impérios europeus como o Império Alemão, o Império Áustro-Húngaro e o Império Turco-Otomano. O fim destes impérios deram origem ao surgimento de diversos pequenos países e de conflitos armados em pequenas escalas na região dos Balcãs, em que minorias étnicas foram massacradas dando origem a uma forte migração populacional em direção aos países que gozavam de maior estabilidade.

Terminada a Primeira Guerra Mundial, os países envolvidos, tentando minorar a grave crise econômica,  iniciaram um processo de restauração numa tentativa de recuperação. Inglaterra e França recuperaram-se nos primeiros anos da década de 1920, contando com empréstimos concedidos por diversos países, principalmente
os Estados Unidos, que possuía interesses em impedir a escalada socialista provida pela URSS, a partir de 1917, que emprestou cerca de US$ 162 bilhões atuais[3]. Com isto, a economia norte americana se fortaleceu em detrimento dos países europeus, uma vez que grande parte deste capital emprestado era justamente para se comprar produtos americanos. Ao longo das décadas, a Bolsa de Nova Iorque superaria a de Londres e o estoque de ouro dos aliados fortaleceu o dólar elevando a moeda americana, mais tarde, ao mesmo nível do ouro.

Já a Alemanha passou por inúmeras dificuldades; era difícil reconstruir o país com as pesadas indenizações que deveriam pagar às nações vencedoras, conforme foi estabelecido no Tratado de Versalhes, mesmo tendo suas contas constantemente revisadas. Por ele, ingleses, franceses e americanos estabeleceram pesadas taxas sobre os alemães, em 28 de julho de 1919, dia da rendição alemã.

Baseado neste tratado, a Alemanha reconhecia ser a causadora do confronto; teria de devolver Alsácia Lorena aos franceses; entregar parte de seu território nacional dando origem a Polônia. No campo bélico, a Alemanha seria proibida de possuir uma marinha e ter uma aviação de guerra;  não teriam artilharia pesada; nem poderia promover o alistamento militar; seria também impedida de ter um exército com mais de 100 mil soldados e a Renânia, na fronteira da Alemanha com Bélgica e França, seria desmilitarizada permanentemente. Mas o golpe mais severo ainda estava por vir.

A indenização de guerra previa o pagamento de 20 bilhões de marcos-ouro, mas, pouco tempo depois, franceses e ingleses estavam exigindo mais de 200 bilhões de marcos-ouro dos alemães. Fato que agravou a crise econômica alemã dando combustível para o partido nazista pregar a desobediência em relação ao Tratado de Versalhes. No fim das contas, foram os Estados Unidos,  a nação que mais lucrou com o conflito, emprestavam dinheiro a diversos países, incluindo a Alemanha, para que ela pudesse recuperar sua economia e pagar suas dívidas.

Mas o Crack da Bolsa de Nova Iorque seria um fator fundamental que ajudaria aprofundar esta crise. A Crise de 1929, que ficou popularmente conhecida como a Grande depressão, constituía-se de crise de super produção, que reverberou mundialmente afetando os países periféricos e, principalmente os europeus que tentavam se reerguer após a guerra.  Tal crise gerou desemprego em massa; a falência de várias empresas; aumento da pobreza. Tal fato será o principal combustível para a ideologia nazista e fascista que acusará o capitalismo como umas das principais causas da forte crise econômica por que passava os europeus.

A crise do modelo de governo democrático e a queda do liberalismo

Foi neste cenário que a democracia começou a entrar em crise. Iniciou-se uma crescente descrença da população em relação a democracia como o melhor caminho para se superar a crise. Então, o poder dos governos democráticos em resolver os problemas que se apresentavam começou a ser posto em xeque. Surgiram movimentos que propunham alternativas ao regime democrático e que se opunham ferozmente ao Socialismo e ao Comunismo.

Para os membros desses movimentos, somente um líder enérgico seria capaz de tirar as nações da crise, ainda que, para isso, fosse necessário cercear algumas liberdades individuais. Eram movimentos  de cunho autoritário, com a expressão da vontade de um líder sobreposta à escolha dos cidadãos;  e nacionalistas, de modo que os interesses da nação ficavam acima dos indivíduos. Em países como a Itália e Alemanha, a crise econômica foi usada como elemento propulsor de discursos inflamados que apontavam a modernidade, a democracia e tanto o capitalismo quanto o comunismo como os culpados pela crise instaurada. Vejamos primeiro o caso da Itália.   

Não sem razão, Eric Hobsbawm chama este período como “Era da Catástrofe” (HOBSBAWM, 1997), período no qual, segundo ele, os sobreviventes do século XIX viram o colapso dos valores  e instituições de cunho liberal ruírem. A desconfiança em relação à ditatura se esvaziava enquanto a ideia de se dar super poderes a lideres em detrimento das liberdades individuais e de expressão tomava cada vez mais força na Europa do pós guerra.

Ao final da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), a Itália, apesar de pertencer ao grupo das nações vencedoras, não teve tantas vantagens como as demais, diga-se Estados Unidos, França e Inglaterra. A situação interna do país se tornou caótica.  Dos despojos da guerra não lhes sobrou nada, pois  não entrara na partilha do território alemão a despeito de estar prevista a divisão com ela nos tratados de paz. A guerra também lhe trouxe pesadas baixas, foram mais de 600 mil mortos e 1 milhão de feridos. Após o conflito, os soldados egressos não encontraram trabalho nem ocupação. No campo econômico a inflação destruía o poder de compra dos italianos agravando a carestia e a fome. Diante de tantos problemas a população questionava a validade de guerra e, cada vez mais, mostrava-se insatisfeita com o governo vigente.

Em 1919 o movimento Fascio di Combattimento surge liderado pelo jornalista Benito Mussolini. O grupo era composto por ex-combatentes e desempregados que defendiam ideias nacionalistas, autoritárias e anticomunistas. Não demorou muito e Mussolini conquistou adeptos em toda a Itália, de modo que em 1921 foi formado o Partido Nacional Fascista.

Em 1922, militantes fascistas marcham até Roma, ocupam prédios públicos e estações de trem. Como resultado da Marcha sobre Roma, o rei convida Mussolini ao cargo de primeiro-ministro. Mussolini passa então a reunir poderes cada vez maiores até que, em 1928, o fascismo se torna uma ditadura comandada por ele. O seu sonho era do restaurar a antiga ordem, baseada na grandeza do império romano, e um ideal que, caso fosse expressa pela frase “A Itália vai voltar a ser grande”, não estaria errada, pois no cerne da questão, estava a ideia da restauração de de um passado imperial de glória. O termo fascismo deriva de fascio, mas também de fasces, que nos tempos do Império Romano era um símbolo dos magistrados: um machado cujo cabo era rodeado de varas, simbolizando o poder do Estado e a unidade do  povo.  Pelo mundo, Mussolini e os camisas verdes, como eram chamados os fascistas italianos, inspiraram governos: na Espanha, Franco; no Brasil, Getúlio Vargas, no seu Estado Novo e o Integralismo; e na Alemanha, Hitler. De fato, o vento autoritário foi tão forte que de 1918 a 1920 dezenas de Assembleias legislativas foram fechadas e durante o período entreguerras, os únicos países que mantiveram suas democracias funcionando ininterruptamente foram Grã-Bretanha, a Finlândia, o Estado livre Irlandês, a Suécia e a Suíça.

Na Alemanha, o fascismo assumiu sua forma extrema, o nazismo. Em 1918, o Imperador Guilherme II renuncia ao trono abrindo caminho para a proclamação da República na Alemanha. Um ano depois, revolucionários socialistas tentam tomar o poder, mas são derrotados e seus planos são frustrados. Tem Início a República de Weimar.

Em 1920 é Fundado do Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães (partido nazista). Estimulado pela Marcha sobre Roma, feita por Mussolini, Hitler incita os nazistas a ocupar a cidade de Munique. A tentativa fracassa e Hitler é preso. Na cadeia, Hitler inicia a escrita de sua obra Mein Kampf (minha luta), contendo as ideias racistas que disseminavam o mito ariano, xenófobas, antissemitas, anticomunistas e da necessidade de um espaço vital, ou seja um espaço natural para desenvolvimento total da nação alemã para além de suas fronteiras. Mais tarde,  o livro se tornaria a Bíblia do Nazismo, o livro de cabeceira da maioria dos alemães e formador da ideologia nazista.

Em 1932, O Partido Nazista ocupa mais de um terço no Parlamento alemão. Em 1934, Hitler torna-se presidente da república e dá início ao Terceiro Reich,  termo cunhado pela propaganda nazista, baseado no sonho de de fundação de um terceiro império alemão. O primeiro havia sido o Sacro-Império alemão, o segundo teria sido o Império Alemão e o terceiro seria este, o dos nazistas.  

Segundo Eric Hobsbawm, estas forças que mobilizaram os ideários fascistas e nazistas possuíam em comum as seguintes características que os uniam: todos eram autoritários e contra a subversão da velha ordem social, caçavam socialistas e comunistas;  todos eram hostis às instituições políticas liberais; todos além de serem reacionários anacrônicos também eram todos nacionalistas ao extremo.

Cabe lembrar as características comuns entre estes regimes totalitários que, grosso modo, baseava-se no(a): O poder estava concentrado nas mãos do Estado; Extinção das liberdades individuais e coletivas; Uma Forte repressão e controle sobre a vida pública e privada; Controle dos meios de comunicação a fim de usá-la para a propaganda política; perseguição aos comunistas e socialistas; caça aos homossexuais, judeus, ciganos e imigrantes.

O horror do holocausto

O antissemitismo nazista foi responsável por um dos maiores genocídios da História. O chamado holocausto refere-se ao extermínio de mais de 6 milhões de judeus nos campos de concentração nazistas. A perseguição aos judeus na Alemanha, na verdade havia iniciado em 1933, embora já houvesse sinal de que algo muito ruim estava por ocorrer com os judeus, desde a publicação do livro de Hitler, Main Kampf, em 1926, quando ele saiu da prisão. Agora, judeus também foram impedidos de ocupar cargos públicos e obrigados a usar uma estrela de Davi na roupa como identificação. Depois foram proibidos de se casarem com ditos “arianos”, como se autodenominavam os alemães, numa tentativa de unirem através do mito, a antigos antepassados e assim manifestar a sua “pureza” racial. A eugenia estava no auge e o mito de uma pureza racial parecia inabalável, afinal, cada vez, mais a ciência, de certo modo, caminhava neste sentido. Ela, que foi um movimento que acreditava piamente na perfectibilidade humana a partir da genética, a eugenia incentivou a “seleção da espécie“: o cruzamento entre indivíduos ditos “puros e superiores”, reverberando pelo mundo inclusive no Brasil[4].

Contudo, esta “pureza” de raça foi tão inventada quanto todos os outros mitos propalados pelos regimes totalitários. Até 1898, não havia um nome para ela, pois só então que foi cunhado o termo “nórdico” que, por sinal,  não se furtou em aceitar pesquisas eugênicas, que obviamente lhes eram favoráveis para embasar tal superioridade e, em muitos casos ditar este viés cientifico como moderno, ainda que nutrisse um forte desprezo à modernidade, algo contraditório, mas próprio de tais movimentos que separam apenas o que lhes seja útil, e onde os fins justificam os meios. Valores conservadores, propaganda de massa, ideologia de barbarismo irracionalista, dentro de um nacionalismo exacerbado deu tom ao horrores que estava prestes a ser descortinado diante dos olhos do mundo.

No auge da 2 Guerra Mundial, eles já estavam confinados em campos de concentração, onde eram submetidos a trabalhos forçados produzindo apetrechos para a guerra e sendo cobaias para testes científicos regados com requintes desumanos. Ali, com alimentação insuficiente e sem condições de higiene e saúde, morriam aos milhares no que Hitler havia denominado de Solução final, (do alemão Endlösung der Judenfrage), um plano nazista que tinha como meta o genocídio da população judaica nos territórios ocupados pelos alemães.   

Mas não apenas judeus estariam nestes campos de trabalhos e morte forçados, mas grupos minoritários considerados “indesejados”, como os eslavos, testemunhas de Jeová, poloneses, ciganos, negros, homossexuais, pessoas com necessidades específicas tanto físicas quanto mentais, foram perseguidas e exterminadas, mas apesar da perseguição aos judeus ser conhecida, o genocídio e suas proporções somente foi descoberto ao final da guerra, quando os exércitos aliados começaram a libertar os prisioneiros e se depararam com milhares de prisioneiros subnutridos e cadáveres abandonados ao ar livre.

De fato, a xenofobia foi um caráter marcante deste período. Acirrada pela forte crise econômica por que passou a Europa após a 1ª Guerra, milhões de pessoas migraram de um país para o outro em busca de melhores condições de vida. Cruzando fronteiras estrangeiras, singrando mares e todos os cantos, homens e mulheres deixavam os países periféricos em direção países que lhes dessem melhores condições de trabalho. Tal fato acirrou o “medo” do outro, na figura do estrangeiro, das minorias, dos sem pátria e sem território. Vistos como escórias e pessoas não gratas, poloneses, ciganos, armênios, curdos, eslavos e outras minorias étnicas foram tachadas como ameaças competitivas pelo pão escasso. Juntavam-se a um novo exército da classe trabalhadora disputando trabalho e quando ascendiam economicamente como os judeus, chegavam a ser os donos empresas e fábricas onde os próprios alemães trabalhavam, o que por fim retroalimentava o ódio contra seu povo e servia de justificação para que sofressem saques e roubos. O fim do século XIX introduzia a xenofobia de massa.

Mas não podemos esquecer um outro elemento tão marcante como esclarecedor, que faz lembrar os tempos presentes em que algumas igrejas evangélicas e católicas parecem apoiar discursos autoritários e/ou reacionários. Na Europa do entreguerras, a Igreja Católica Romana, a despeito de suas discordâncias com o totalitarismo em alguns pontos guardava uma estreita concordância. Ambos “nutriam um ódio comum pelo Iluminismo do século XVIII, pela Revolução Francesa e por tudo que derivava dela: democracia, liberalismo e, claro, mais marcadamente, o “comunismo ateu”[5].

E hoje?

É claro que não se pode, de forma alguma, tentar enquadrar o presente no passado, ou reviver tais fantasmas com as roupas do hoje. Mas existem indícios muito forte de que, pelo menos, no subterrâneo do tecido social vigente, existam ranhuras que deitam suas raízes nas mesmas ideias que foram propaladas no período entreguerras. Ideias como a do racismo, do nacionalismo, do antissemitismo e do anticomunismo estão presentes ainda hoje.

Uma releitura enviesada do passado, negacionista que nega o holocausto, rechaça os direitos das minorias étnicas e suas demandas são pontos que ligam o tempo presente a este passado não muito distante. Hoje, como ontem, não é difícil encontrar apoio para ideias que negam que a escravidão tenha sido maléfica, que acreditam num ideário cuja raiz recorre a um passado de glória que nunca existiu. A perseguição ao diferente, discrepante ou que não encaixa no jogo moral vigente, seja da ordem do gênero ou de classe é perseguido e vistos como os inimigos da nação.

Por tudo isto exposto, e guardadas as devidas proporções, não se pode negar que os indícios totalitários estão aí, ainda que inconscientemente. O discurso é sedutor e propõem medidas simplórias. Eleger um inimigo, eliminá-lo quando possível for, em nome da restauração da ordem vigente que é, logicamente excludente, guarda certa relação com os fatos históricos vivenciados na Europa do entreguerras.  

Este artigo não tem por objetivo afirmar a existência de regimes totalitários hoje, mas o de, através da História apontar as devidas semelhanças entre o agora e o que se foi, no sentido de alertar a cada um de nós sobre o perigo do retorno destes males sociais. Sobretudo porque, algo que não se pode negar e que a História demonstrou é que ambientes de forte crise social  e econômica é um campo fértil para o surgimento de lideranças autoritárias e regimes antidemocráticos.  Quando isto acontece, fantasmas reaparecem no imaginário transvertidos de ordem.  

Referências bibliográficas

Arendt, Hannah (2013) [1951]. Origens do totalitarismo. São Paulo: Companhia das Letra.

HABIB, Paula Arantes Botelho Briglia. Eis o mundo encantado que Monteiro Lobato criou: raça, eugenia e nação. 2003. 175 p. Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciencias Humanas, Campinas, SP. Disponível em: <http://www.repositorio.unicamp.br/handle/REPOSIP/281539>. Acesso em: 3 ago. 2018.

HOBSBAWM, Eric (2015). A era dos impérios: 1875-1914. São Paulo: Paz e Terra.

HOBSBAWM, Eric. Era dos extremoso: o breve século XX, 1914-1991, 2ª edição. São Paulo; Companhia das Letras, 1995.

RICHARD, LioneI. A República de Weimar (1919-1933). São Paulo: Companhia das Letras, 1988.

Fontes online:

https://encyclopedia.ushmm.org/content/pt-br/article/the-final-solution

https://www.rfi.fr/br/europa/20181112-como-primeira-guerra-mundial-arruinou-economia-da-europa


[1] Texto elaborado para as aulas de Historia Contemporânea II, ministradas na Univesidade Federal Fluminense, 2020.

[2] Veja matéria sobre o neonazismo https://www.politize.com.br/neonazismo-o-rosto-do-nazismo-na-atualidade/

[3] https://www.rfi.fr/br/europa/20181112-como-primeira-guerra-mundial-arruinou-economia-da-europa

[4] Sobre a eugenia no Brasil, veja o excelente trabalho de Paula Habib  https://anpuh.org.br/uploads/anais-simposios/pdf/2019-01/1548210412_156d47b6171e9a5e966d70ae2f48227b.pdf

[5] HOBSBAWM, Eric. Era dos extremoso: o breve século XX, 1914-1991, p.118.  

MORTE E SOBREVIVÊNCIA

Postado por MEDEIROS DA SILVA PEREIRA em 16 set 2020


Doenças até então desconhecidas, como malária e febre amarela, dizimaram a população nativa em menos de um século, exigindo ajustes econômicos e sociais que levariam à criação de uma sociedade multiétnica no continente



por Kennet h Maxwell

Uma das consequências imprevistas do contato intercontinental e da comunicação marítima iniciada por Colombo em 1492 foi a chegada de doenças do Velho Mundo que atacaram os habitantes nativos do Novo Mundo, que não tinham imunidade. As planícies tropicais do Caribe e das Américas do Norte e do Sul sofreram um virtual despovoamento em menos de três quartos de século. O istmo do Panamá, onde os primeiros espanhóis encontraram diversos assentamentos prósperos, transformou-se virtualmente num descampado vazio e pestilento. David Browning estima que em Honduras a população anterior à conquista, de 1,2 milhão, havia caído para 18 mil em 1590. O declínio no Peru também foi grave. A população do Peru na época da chegada de Pizarro foi estimada por Noble David Cook em cerca de 9 milhões. No meio século seguinte a população diminuiu para pouco mais de 1 milhão e, em 1620, havia caído para 600 mil. A diminuição geral foi de 93% no século seguinte ao primeiro contato entre os europeus e os habitantes indígenas. A população do México, que de acordo com alguns estudiosos poderia ter chegado a 22 milhões em 1519, caíra para cerca de 1 milhão em 1600. Os historiadores demográficos pioneiros Woodrow Borah e Sherbourne Cook afirmaram que seis sétimos da população total havia sido extinta entre 1519 e 1605, de modo que por volta de 1620-25 a população indígena era de 3% do que havia sido em 1519. Embora os acadêmicos ainda discutam os números, é evidente que as primeiras décadas do assentamento europeu foram um desastre para a população indígena. A catástrofe demográfica no continente americano repetiu o padrão do Caribe, cuja população pré-colombiana estava virtualmente extinta em 1550. Mas não completamente.

Houve alterações vitais em relação à experiência caribenha. Nas terras baixas tropicais, assim como nas ilhas do Caribe, muitos grupos indígenas morreram antes de conseguir criar imunidade. Mas, nos ambientes mais elevados e frios, onde doenças africanas como a malária e a febre amarela não se disseminaram, a perda foi menos extensa, e por isso foram possíveis uma sobrevivência residual e uma eventual recuperação. Os altiplanos peruanos e bolivianos, é claro, mantêm ainda hoje uma vibrante população e cultura indígenas. O professor Noble David Cook afirma que a altitude da puna andina talvez explique em parte essa resistência. “O “soroche”, o mal-estar da altitude, normalmente afeta os habitantes de locais ao nível do mar que se aventuram nos planaltos”, ele aponta. Os indígenas dos Andes sobrevivem devido a sua grande capacidade pulmonar, uma elevada taxa de células vermelhas no sangue e um grande volume de mioglobina nos músculos. Essa forte adaptação ao ambiente não ocorria com os estrangeiros, e consequentemente os quéchuas e aimaras não foram deslocados nem se miscigenaram com os invasores. Os professores Sherbourne Cook e Woodrow Borah também demonstraram que na Mesoamérica os índices de sobrevivência entre as populações indígenas foram maiores nos planaltos que no litoral. O ponto-chave de uma perspectiva de longo prazo é o de que no interior o colapso demográfico da população indígena no hemisfério ocidental não foi total. A sobrevivência de populações indígenas é de profunda importância para o futuro da América Latina. Nas ilhas do Caribe e nas terras litorâneas, o virtual extermínio das populações indígenas foi seguido da introdução de plantações de produtos alimentares, com trabalho de escravos africanos. Uma sequência semelhante se desdobraria mais tarde no litoral do Brasil. Com efeito, ao longo do tempo ocorreu uma substituição da população. Os padrões raciais e sociais nessas regiões seriam profundamente marcados pelo desenvolvimento de plantações com mão-de-obra escrava, predominantemente de cana-de-açúcar, e influências africanas. Elas reproduziam os padrões estabelecidos no primitivo sistema afro-atlântico nas ilhas da Madeira, Cabo Verde e São Tomé e continuariam a fazê-lo até o século 19, em termos de sua participação no comércio de escravos, na agricultura monocultural voltada para a exportação e na escravidão africana. Mas nos planaltos a composição racial da população refletiu a extensão da sobrevivência ameríndia, e aqui, com o tempo, surgiria uma civilização híbrida indo-européia.

Pecuária x agricultura
Em todo o México e América Central, assim como no Caribe, a doença não foi o único fator de ruptura da sociedade indígena. O gado do Velho Mundo introduzido nas Américas pelos primeiros colonos espanhóis também competiu com a população indígena por alimento e espaço, danificando as plantações de milho e feijão e devastando as pastagens. Os animais trazidos do Velho Mundo pelos espanhóis perturbaram seriamente o equilíbrio entre a população e o suprimento alimentar, especialmente na Mesoamérica, onde o milho era o produto básico.
Depois da conquista, ocorreu uma explosão populacional entre o gado, porcos, carneiros e cabras, os quais causaram grandes danos às plantações de milho indígenas, que não eram protegidas devido à falta de experiência com concorrentes pela subsistência. As medidas tomadas pela população indígena eram muitas vezes ineficazes. O sistema de valor dos conquistadores favorecia o gado. Bois e carneiros eram protegidos pela lei, os costumes e o sentimento castelhanos. As leis que protegiam a pecuária na península Ibérica foram exportadas para o México e permitiam que o gado pastasse em propriedade alheia depois da colheita. E os animais destruidores eram, afinal, propriedade dos vitoriosos; a agricultura era província dos derrotados.
Os animais europeus, assim como a doença, muitas vezes precederam e acompanharam os colonizadores espanhóis; e sua chegada, especialmente no México, transformou e hispanizou a paisagem. Sherbourne Cook argumentou que o gado inicialmente se expandiu até os limites da subsistência, e o resultante excesso de pastejo, através do qual destruíram seus próprios meios de sustento, transformou regiões outrora férteis em terras áridas e semidesertas. O resultado foi uma revolução ecológica, exagerando e completando o processo que o uso intensivo da terra e as vastas populações haviam iniciado no período pré-colombiano. A erosão do solo foi agravada pela introdução do arado europeu e pelo desflorestamento generalizado para suprir a demanda de fabricação de cal e de combustível para as fornalhas usadas para fundir metais preciosos.
O ritmo de redução das populações nativas, segundo cálculos de Borah e Cook, parece ter-se estabilizado por volta de 1565 no planalto e, na região costeira, por volta de 1573. O encolhimento da população indígena continuou até meados do século 17, mas em ritmo muito menor. O ponto baixo da população indígena no México foi por volta de 1620-25, quando, na estimativa de Sherbourne Cook e Borah, o número de indígenas caiu para 730 mil. Noble David Cook situa o ponto mais baixo para o Peru na década de 1620.
O distúrbio biológico e ecológico inexorável resultante da chegada de europeus e africanos, suas doenças e animais, no entanto, com o tempo também minou o sistema de controle imposto pelos conquistadores: o sistema de “encomienda”, cuja base essencial era a maciça força de trabalho indígena. Inicialmente, o sistema de “encomienda” teve um extraordinário sucesso logo após a conquista, sustentando a sociedade urbana espanhola em meio às grandes populações indígenas. Ele também permitiu que os espanhóis no Novo Mundo acumulassem capital com o qual puderam financiar o desenvolvimento nas Américas sem recorrer a credores europeus.
O declínio geral da importância econômica da “encomienda” variou consideravelmente de região para região, em ritmo e extensão, mas a causa fundamental desse recuo foi a ruptura demográfica e ecológica e a contração da população da sociedade ameríndia.
Durante as décadas de 1560 e 1570 a estabilização do índice de declínio populacional entre os ameríndios provocou uma série de ajustes econômicos e administrativos na América espanhola, de importância fundamental para o futuro. A doença e a alteração ecológica também minaram seriamente a hierarquia indígena local necessária para mobilizar as massas indígenas para os senhores espanhóis. Esses desenvolvimentos não foram acontecimentos repentinos que geraram relacionamentos totalmente novos. Foram sobretudo um processo em que os elementos que haviam sido periféricos enquanto existira uma ampla população indígena com o tempo tenderam a tornar-se centrais.
O gradativo ajuste social e econômico ao declínio da população indígena alterou profundamente o relacionamento entre indígenas e europeus no Novo Mundo, modificou os padrões de propriedade da terra, transformou a vida interna social e cultural das comunidades indígenas e influenciou a maneira como a administração real operou em nível local em toda a América espanhola. Foi, de modo geral, um processo que transformou o governo indireto em direto e possibilitou a criação gradativa de uma sociedade multiétnica, mestiça, enraizada nas Américas.
Os espanhóis na América poderiam facilmente ter permanecido como os senhores coloniais europeus na Ásia e na África, mais tarde uma elite estrangeira superficial e imposta; uma classe dominante temporária de forasteiros permanentes. Nessas circunstâncias, quando a população indígena recuperasse a autoconfiança ou a potência imperial européia se enfraquecesse devido a envolvimentos ou declínio, essa presença estrangeira poderia ter sido expulsa, como ocorreu posteriormente com os colonizadores europeus na Ásia e em grande parte da África.
Mas não foi o que aconteceu nas Américas. A peculiar história demográfica do colonialismo europeu no hemisfério ocidental foi criar uma nova sociedade multirracial crioula, permanentemente enraizada no Novo Mundo. Esse resultado extraordinário ocorreu cumulativamente ao longo do tempo e com muitas nuanças regionais e locais, mas as mudanças demográficas que a possibilitaram ocorreram com relativa rapidez.
A catástrofe demográfica que assolou a população indígena teve um impacto imediato sobre as relações dos colonos espanhóis com a terra, algo que teve interesse mínimo ou periférico para eles enquanto existiu uma vasta população indígena.

À medida que a população indígena diminuía, se tornava cada vez mais problemático garantir o suprimento alimentar em base regular



Os espanhóis no México e no Peru tentaram desde o início recriar no hemisfério ocidental um estilo de vida europeu e, para tanto, introduziram trigo, uvas, árvores frutíferas européias. No entanto isso só se tornou uma perspectiva comercialmente viável quando o trabalho indígena deixou de fornecer alimento suficiente para manter os centros urbanos adequadamente abastecidos. Mas, à medida que a população indígena diminuía, se tornava cada vez mais problemático garantir o suprimento alimentar em base regular. No México central, por exemplo, o preço do milho triplicou entre 1520 e 1573, e de 1542 a 1573 o preço do trigo subiu num ritmo ainda mais acelerado. O aumento dos preços dos alimentos, a crescente demanda urbana, a falta de sucesso em persuadir os indígenas a cultivar o trigo (o que não é de surpreender, dada a importância do milho na vida cultural do indígena e o fato de que o rendimento do trigo era substancialmente menor que o do milho), tudo isso tornou necessária e cada vez mais rentável a operação de fazendas de propriedade dos espanhóis diretamente administradas por eles, nos arredores de Lima e da Cidade do México. O problema de garantir uma força de trabalho suficiente para as propriedades espanholas no vale do México enquanto a população indígena encolhia levou as autoridades espanholas a intervir diretamente na distribuição de mão-de-obra coagida. Em 1560, por exemplo, na região da Cidade do México, 2.400 indígenas eram distribuídos semanalmente entre 114 plantadores de trigo espanhóis. Em breve o processo de distribuição, frequentemente baseado em protótipos pré-colombianos e sob uma variedade de nomes (“repartimiento” ou “cuatequil” no México, “mita” no Peru, “mandamiento” na Guatemala e “minga” no Equador), tornou-se um importante meio de recrutamento de trabalho forçado em toda a América espanhola.

Novo ambiente
A transição para a produção de trigo em grande escala no vale do México ocorreu entre 1563 e 1602, e entre 1580 e 1630 também se desenvolveu a produção de trigo em grande escala nas propriedades rurais espanholas. O aumento de empreendimentos agrícolas teve consequências importantes. Ele levou a terra para a propriedade privada. A palavra “hacienda”, anteriormente um termo genérico para “propriedade”, assumiu novo significado na América espanhola, como uma “entidade econômica geradora de produtos agrícolas ou gado para o mercado”. O título da terra era obtido pelos espanhóis por concessão direta (“merced”) de terras “desocupadas” ou por meio de aquisição do cacique ou da comunidade indígena. Quando a terra era ilegalmente usurpada de território indígena, a coroa mais tarde regularizava as invasões através de um pagamento, pelo qual os espanhóis obtinham o título legal (“composición”). Em 1620, um terço do vale do México tinha passado à propriedade de espanhóis, representando mais da metade da terra agrícola utilizável da região. O crescimento da propriedade rural (“hacienda”) na América espanhola levou os indígenas e os espanhóis a um novo relacionamento, colocando o indígena assim empregado num ambiente onde predominavam os costumes europeus. A importância social dessa nova estrutura de relacionamento foi ampla e atraiu muitos dos que haviam saído das comunidades indígenas para um novo ambiente social e econômico. A “hacienda”, assim como a cidade, também forneceu um habitat para a crescente população mestiça de ascendência indo-européia. A “hacienda” distribuía sua força de trabalho de duas maneiras: como uma equipe permanente ligada à propriedade pelo pagamento de salários, que muitas vezes com o tempo se tornava uma forma de servidão por dívida, ou como agricultores de subsistência dispersos, vivendo em pequenas áreas da terra da “hacienda”.

Processo discreto
Embora intensamente cultivados, esses minifúndios não produziam excedente suficiente para evitar que os pequenos agricultores de subsistência buscassem emprego com o fazendeiro. As plantações que eles produziam tinham a vantagem, porém, de aliviar o fazendeiro da despesa de sustentar uma força de trabalho totalmente composta de assalariados. O relacionamento entre a “hacienda” e os agricultores de subsistência era, portanto, simbiótico.
O pequeno agricultor fornecia trabalho extra na época da colheita, e o terreno de subsistência sustentava sua família durante o resto do ano, quando o trabalho era escasso. O fazendeiro ficava livre da despesa de sustentar uma grande mão-de-obra permanente, que em muitos casos teria tornado não-rentável a operação da fazenda. Mesmo quando as fazendas se envolveram numa produção semiindustrial, como na América Central, no processamento de tintura índigo, distribuíram sua terra para meeiros e arrendatários (“colonos”) dessa maneira.


O tributo e o controle do trabalho foram preferidos nos primeiros anos após a conquista, e a “encomienda” não envolvia a propriedade da terra. Mas, com a desastrosa redução da população indígena, essa situação mudou. A propriedade espanhola surgiu assim em resposta à mudança das condições de mercado e refletiu uma mudança de parte dos espanhóis, afastando-se de um sistema de dominação indireto para um de empreendimentos diretamente administrados. A evolução da propriedade da terra espanhola foi um processo discreto, portanto, separado da “encomienda” da geração da conquista. Alguns “encomenderos” podiam estabelecer a propriedade direta da terra nas regiões das quais obtinham tributo ou serviços, é claro. Certamente eles estavam numa posição que permitia fazê-lo.
Mas o processo em geral foi de consolidação de uma presença européia assentada permanentemente no campo e uma ampliação e um aprofundamento da implantação do hispano-americano nas Américas. A propriedade rural espanhola, portanto, surgiu para suprir condições específicas -a necessidade de fornecer produtos para um mercado que o setor indígena não era mais capaz de suprir, e seu desenvolvimento tornou-se possível pela disponibilidade de terras que resultou da ruptura e da contração da população indígena.
Nas regiões de altiplano na América espanhola, do México às Américas Central e do Sul, porém, a população indígena em 1600 ainda era maioria. O que mudou completamente no primeiro século da colonização foi a relação demográfica entre os indígenas e os europeus que se assentaram entre eles.
Os indígenas permaneceram o componente básico da força de trabalho hispano-americana durante todo o período colonial, mas sua vulnerabilidade e exploração aumentaram drasticamente em consequência do declínio demográfico. E, enquanto não se pode minimizar a extensão da desmoralização, ruptura e destruição que assolaram a população indígena das Américas após a conquista, o fato importante foi a sobrevivência da população nativa. A longo prazo, isso não seria menos importante para o futuro do que a trágica história de morte e declínio dos indígenas.


Kenneth Maxwell é historiador inglês e um dos principais brasilianistas da atualidade. É autor de “A Devassa da Devassa” e “Marquês de Pombal – Paradoxo do Iluminismo” (ambos pela ed. Paz e Terra). Escreve regularmente no Mais!.
Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves.

Texto publicado originalmente em: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs1108200206.htm acessado em 04/04/2020


CONCEITOS TRABALHADOS NO TEXTO

MITA OU REPARTIMIENTO:

Importante modo de recrutamento de trabalho indígena, assalariado, porém, forçado, usado na América Espanhola.

HHACIENDA:

Latifúndios, gestados por colonos, em terras usurpadas dos indígenas, cuja produção era voltada para o milho e agropecuária, cuja mão de obra era suprida pela Mita.

O que explica a suposta resistência africana ao covid 19 (Prof. Barbalhão explica)

Postado por MEDEIROS DA SILVA PEREIRA em 16 Maio 2020

Novo video em meu canal História+, confiram

O Prof. de História mais legal do mundo, o famoso Barablhão explica os motivos pelos quais talvez a África ainda não tenha sofrido mais baixas pelo Covid 19.

Eventos

Postado por MEDEIROS DA SILVA PEREIRA em 19 nov 2019

5ª feira de 10h às 16h é a comemoração do 1º ano do Projeto Vai Ler ou Vai Amarelar no Espaço do Hotel Deolinda, no centro de Pádua/RJ.
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As origens da Revolução Industrial (Comentário à Eric Hobsbawm

Postado por MEDEIROS DA SILVA PEREIRA em 04 set 2019

A Revolução Industrial

Dizer ao certo onde começou a chamada Revolução Industrial ou  “evolução acelerada” foi algo que durante muito tempo integrou os  historiadores, porém Eric Hobsbawm em seu livro “A Era das Revoluções: 1789-1848” defende a data de 1780 para o inicio do  que chamou de a maior revolução da historia no mundo.

A Revolução Industrial nada mais foi que uma profunda mudança  tecnológica no meio de produção da sociedade inglesa que a partir  daí dar-se inicio a uma nova relação entre o termo que surge  chamado de capital e o modo de produção que foi implementado. A principal mudança se deu no meio agrícola onde a agricultura não  será mais o motor da sociedade e sim o trabalho por meio de  máquinas que gera uma acumulação de capital.

A Revolução Industrial trouxe consigo a centralização do  processo produtivo mas mãos de uma pessoa que será o patrão,  onde o objetivo será a obtenção de lucro. Entre esses meios de  processos os trabalhadores terão que a controlar máquinas, o  trabalho realizado por esse meio ficou conhecido como  maquinofatura.

O processo que desencadeou essa revolução foi o aumento das  cidades que cada vez precisavam de têxteis – que tinha um  desenvolvimento lento – alimentos e bebidas, cerâmicas e outros  produtos de uso domestico, daí surgiram as primeiras industrias por  volta de 1840.

A industria que logo se destacou foi a de algodão, já que este era  a principal matéria-prima dos ingleses, logo foi vista como parte  principal para a criação de novas tecnologias, onde surgem a

máquina de fiar, o tear movido a água, a fiadeira automática e logo  mais tarde a máquina de fiar a motor. Porém o algodão não era  nativo da Inglaterra, provinha das expansões colonialistas.

Máquina de Fiar

O crescimento da industria algodoeira foi tanto necessária para  abastecer as demandas e gerou o capital que a Inglaterra precisava  para sua revolução, que segundo o autor faz uma alusão a

Revolução Francesa, logo que que também foi de caráter econômico  e social.

Também, outras pequenas coisas contribuíram aos poucos para  a mudança dos modos de produção como uma mair utilizacão do  ferro como a pudelagem e a laminação, mais um ponto que não  pode ser deixado de lado e o fato do investimento estrangeiro na  Inglaterra, pois a maiorias dos países ainda estavam se  recuperando das guerras napoleônicas e pediam empréstimos a  Inglaterra para sua recuperação.

O autor busca traçar o ímpeto da industrialização que considera  o principal, a mão-de-obra, a Revolução Industrial alterou  profundamente as condições de vida do trabalhador braçal,  provocando inicialmente um intenso deslocamento da população  rural para as cidades, quanto mais gente para trabalhar, maior será o  lucro, principalmente nesse período que as populações se  avolumaram em torno das fabricas, criando assim verdadeiras  cidades sem infra-estrutura para comportar tanta gente em um  pequeno espaço, esse é o que chamamos de transferência de  recursos econômicos.

Os Cercamentos

A verdadeira revolução se deu no campo social e não  tecnológico, pois foi na mudança de vida das pessoas que marcou a  transição de um modelo agrário e dependente da terra, para algo  que impulsionasse para uma evolução, porém nem toda evolução e  benéfica, não que a revolução industrial não tenha sido, digo que  com ela surgiu problemas que antes não era possíveis, considero  com a leitura desse texto fica claro que neste ponto da história um  novo caminho se abre, caminho esse que até hoje esta sendo  traçado seja através de varias variantes da revolução industrial ou  da cibernética, mas o impacto que a revolução na Inglaterra cousou  foi única, novos conceitos surgiram como proletariado, capital, maisvalia  e tantos outros agregados ao socialismo fruto das  desigualdades desse modelo de produção.

Documentário Saúde e Adoecimento de Populações Quilombolas

Postado por MEDEIROS DA SILVA PEREIRA em 22 mar 2019

Documentario produzido pelos alunos do curso de Licenciatura Especial em Educação do Campo, da UFF, campus Santo Antônio de Pádua, como trabalho final do Tempo Comunidade 18.2, sob a coordenação do Prof. Júlio César Medeiros.

Encontro com Fátima Bernardes | Professor resgata história sobre reis e cultura africana | Globoplay

Postado por MEDEIROS DA SILVA PEREIRA em 03 jan 2019

Veja como foi a minha entrevista no programa Encontro com a Fátima Bernardes, na Rede Globo

Fonte: Encontro com Fátima Bernardes | Professor resgata história sobre reis e cultura africana | Globoplay

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